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Especial

A colecionadora de espinhos

Floricultora de Alta Floresta possui a maior coleção de cactos do país

Geral | 07 de Outubro de 2015 as 10h 28min
Fonte: Jamerson Miléski

Tão radiante quanto as plantas que cultiva, Apolônia Grade é uma daquelas pessoas cujo bom humor contagia. Simpática como alguém que sempre lhe entrega flores no final de uma conversa (fato!), a floricultora leva uma vida que é objeto de desejo de muitos: faz o que ama, seu trabalho fica a dois minutos de caminhada da sua casa e a sua casa... bom, a sua casa é simplesmente um pedaço do paraíso, cercado de mata nativa, climatizado por um lago natural, frequentado por animais silvestres, ornamentado por flores exóticas, sonorizado pelo gorjear dos pássaros e a menos de um quilômetro do centro da cidade. É uma vida sem espinhos... mas Apolônia fez questão de ter milhares.

Nesse seu Éden particular, Apolônia reuniu mais de 4 mil cactos de diferentes espécies. Seu acervo é considerado a maior coleção de cactos particular do Brasil, superando inclusive o Jardim Botânico do Rio de Janeiros que reúne pouco mais de 2,6 mil exemplares. O cactário batizado de “Sofá de Sogra” – em alusão a uma espécie particularmente espinhenta – já foi aberta a visitação. Depois de alguns dissabores com colecionadores mal intencionados, Apolônia optou por restringir as visitas. Mas abriu o seu porta-jóias para nossa reportagem mostrar a diversidade de plantas que conseguiu reunir em Alta Floresta.

E nos recepcionou com traje de gala: botina, chapéu de palha e uma hipnotizante jibóia-vermelha enrolada no braço. Desfilando entre os espinhos com a serpente domesticada em punho, Apolônia deu uma aula sobre essas plantas que são originárias das Américas. “O cacto é a planta mais generosa que existe. Vive meses e anos sem água e quando recebe a primeira gota retribui com uma flor linda, repleta de perfume”, conta Apolônia.

A coleção de cactos começou em 1992, pouco depois de Apolônia abrir seu orquidário. Antes disso, trabalhava como bancária na Caixa Econômica. Uma LER (Lesão por Esforço Repetitivo), havia lhe afastado da função. Parou de contar dinheiro e, quando sua filha nasceu, começou a contar plantas. “Ganhei uma orquídea de presente de um amigo quando minha filha nasceu. Foi nesse momento que tudo começou. Em dois anos tinha mais de 100 plantas e depois disso o viveiro não parou de crescer”, lembra a floricultora.

O encanto pela flora fez Apolônia cursar biologia, pela simples vontade de entender mais sobre o comportamento das plantas. Sua floricultura foi crescendo com orquídeas, rosas do deserto e plantas ornamentais de toda natureza. Os cactos, mesmo tendo uma aceitação comercial menor que as coloridas flores, continuaram sendo uma paixão a parte.

Apolônia conta que chegou a fazer uma viagem de 29 dias, percorrendo mais de 10 mil quilômetros na parte árida do Nordeste Brasileiro, em busca de novas espécies. Foi quase um mês procurando espinhos. “Eu queria muito encontrar uma coroa de frade, um cactos que só existe no Brasil e que leva entre 20 a 30 anos para chegar no final do seu ciclo, com a coroa completa. Estávamos dentro do carro, logo a frente um caminhão que do nada saiu da pista. Ele passou em cima de um monte de cactos coroa de frade adultos, que deviam ter mais de 20 anos. Eu fiquei em prantos”, lembra Apolônia contando com detalhes a paciência do seu marido que a consolava em meio a viagem. “Essa não foi a única vez que eu fiz ele me acompanhar para correr atrás de uma planta”, confessa.

Mais do que quantidade, o que chama a atenção na coleção de cactos são as formas que Apolônia conseguiu dar as plantas. Todas transbordam vicissitude. Ricas em cores e formatos as plantas, naquele local, fazem esquecer do quão insalubre e hostil era o local em que brotaram.

Apesar de chamar todos os cactos pelo nome e saber onde está cada espécie em seu cactário, Apolônia tem o seu preferido. Cactus Uebelmannia, popularmente conhecido como “Ambrosia de Minas”. A espécie brasileira encontrada nas regiões montanhosas de Minas Gerais e da Bahia, tem uma coloração peculiar, com um tom levemente bordô e um formato que lembra um balão de ar quente. “É singular, raro e muito bonito”, justifica Apolônia.

Seu acervo conta com diversas espécies impressionantes, como o Peyote, um cactos que concentra em sua seiva uma alta dose de mescalina e por isso é considerado alucinógeno.

Quem não conseguir a permissão para visitar a coleção privada de Apolônia pode ter uma amostra em sua floricultura. Lá ela coloca a venda as plantas geradas a partir da sua coleção. O passeio inclui a aula de como cuidar das plantas – que Apolônia faz questão de dar – e uma selfie com a dócil “Lara” uma arara azul que fez da floricultura a sua casa. E no final, certamente Apolônia irá lhe entregar uma flor. É quase impossível sair de lá sem comprar algo, seja pela beleza das plantas que cultiva ou pelo carisma impar dessa pessoa.

 

Essa reportagem foi originalmente produzida para a Revista Notícia, edição especial de Alta Floresta.