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Ciência

O rosto ‘humano’ do santo dos pobres

Face de Martinho de Porres reconstruída pela ciência revela um santo com a ‘cara’ da América Latina

Geral | 04 de Novembro de 2015 as 11h 21min
Fonte: Jamerson Miléski

Esqueça as bochechas rosadas, os olhos azuis, o nariz arrebitado, os delicados lábios e aquele ar escandinavo que normalmente emblemam os santos católicos. São Martinho de Porres, em vida, foi conhecido como o Frei dos Pobres. E a ciência atestou que sua fisionomia era fiel a do povo que o cercava.

Mulato, cabelo crespo, olhos desalinhados, queixo protuberante e uma “boca para dentro”, resultado da aproximação da mandíbula com o maxilar, provocada pela perda dos dentes: eram apenas 2 quando morreu, e ambos não se encontravam. Assim era o rosto do “Santo da Vassoura”, o primeiro ícone mouro da América Latina reconhecido pela Igreja Católica.

A imagem do Santo foi apresentada na noite de terça-feira (3), na Basílica do Santíssimo Rosário, em Lima, no Peru. O quadro com os traços humanos da figura sagrada foi exposto aos fieis que lotaram a basílica durante a celebração. A face foi revelada pelo designer 3D de Sinop, Cícero Moraes, autor da reconstrução e convidado de honra da solenidade. Em sua apresentação, o sinopense explicou os processos realizados para chegar à reconstrução do rosto de São Martinho de Porres.

Assim como os demais trabalhos sacros feitos por Cícero, o rosto de São Martinho foi reconstruído a partir do seu crânio, que estava armazenado e preservado na Basílica do Santíssimo, no Peru. A Ebrafol (Equipe Brasileira de Antropologia Forense e Odontologia Legal), capitaneada pelo doutor Paulo Miamoto, conduziu a exumação dos ossos. Além de São Martinho também foram estudados os restos mortais de San Juan de Macias e Santa Rosa de Lima. Os crânios tiveram seus dados registrados por escaneamento fotográfico, gerando uma imagem em 3 dimensões. A partir da análise dos ossos foram determinadas as características antropológicas de cada indivíduos, que serviram como base para a reconstrução da face.

Embora esse seja o 5º santo reconstruído por Cícero, São Martinho reservou uma surpresa para o designer sinopense. “Desde a reconstrução de Santo Antônio eu ignoro completamente a representação artística dessas pessoas, porque em geral em nada se assemelham. Isso me deixou surpreso na reconstrução de São Martinho. Existe uma pintura apresentada como a imagem oficial dele que se assemelha muito ao resultado final da reconstrução. As vezes nós cientistas nos fechamos demais em alguns pontos e esquecemos que haviam pessoas preparadas em épocas diferentes para retratarem as grandes personalidades”, comentou Cícero.

Se dessa vez a ciência não “revelou” uma face, ela foi responsável por confirmar a imagem mental que muitos fiéis já tinham de seu santo. Os traços humanos, em parte sofríveis, do santo mulato emocionaram as pessoas durante a apresentação. Além dos quadros, a Basílica recebeu as imagens em 3 dimensões que irão proporcionar a impressão do busto de São Martinho.

Filho de um nobre espanhol como uma africana alforriada, Martinho iniciou a carreira religiosa aos 15 anos de idade, enfrentando resistência devido a cor da sua pele. Ele exercia o ofício de cirurgião, dentista e barbeiro, tendo registros de atos de caridades em momentos de epidemias e relatos de cura através do toque. Conforme a crença popular, durante uma epidemia, Martinho começou a recolher os enfermos na sede da igreja. Seu superior alertou-o do risco de proliferação da doença entre os padres e proibiu tal prática. Martinho passou a atender os doentes em uma casa emprestada, mas dias depois encontrou um índio ferido a faca. Acabou dando amparo e o levou para seu quarto. Martinho foi repreendido pelo superior por desobediência e respondeu: "Perdoa meu erro, e por favor me instrui, porque eu não sabia que o preceito da obediência se sobrepõe ao da caridade".

Martinho morreu em 1639, com 60 anos de idade, fustigado pela vida de caridade e oração. Foi canonizado só em 1962.