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Sinop

Depois de sumirem na Câmara, contas de Juarez são aprovadas

Votação das contas ocorreu 11 meses depois do TCE emitir o relatório pela aprovação

Polícia | 23 de Novembro de 2018 as 18h 32min
Fonte: Jamerson Miléski

| Foto: GC Notícias

Em uma sessão confusa, com um certo tumulto, a Câmara de vereadores de Sinop aprovou, na tarde desta quinta-feira (22), as contas de gestão da prefeitura de Sinop, referentes ao exercício de 2016 – último ano do mandato de Juarez Costa (PMDB). Com 4 votos contrários, o legislativo municipal referendou a posição do TCE (Tribunal de Contas do Estado), que expediu relatório pela aprovação das contas do ex-prefeito. Juarez teve, enfim, suas contas aprovadas, quase dois anos depois de encerrar a sua gestão.

Insatisfeito com o lapso temporal, o vereador Ícaro Severo (PSDB), apresentou um requerimento pedindo que a votação fosse suspensa. O vereador questionou o fato do processo ter chego à Câmara em janeiro de 2018 e só ser apreciado agora, 10 meses depois. “Esse lapso temporal causa estranheza. Porque a Câmara demorou 10 meses para apreciar as contas do ex-prefeito?”, indagou o vereador.

Ícaro lembrou que as contas de gestão precisam ser abertas para consulta do contribuinte por pelo menos 60 dias. Segundo ele, o rito não foi cumprido. Por isso, o requerimento pedia a suspensão da votação e a abertura de um procedimento interno para apurar os motivos da morosidade.

O presidente da Câmara, Ademir Bortoli (MDB), teve uma posição dúbia. Ele disse que acolheria o requerimento mas não suspenderia a votação. “Essa presidência acata o requerimento e irá tomar as medidas cabíveis”, disse Bortoli na tribuna. No entanto, a votação continuou.

Ícaro voltou a tribuna para pedir que o requerimento fosse colocado em votação, para apreciação do plenário. Bortoli repetiu a frase, dizendo que acolheria o pedido e abriria o processo para apurar os fatos.

A votação seguiu. As contas de Juarez foram aprovadas por 11 votos a 4. Foram contra Adenilson Rocha (PSDB), Dilmair Calegaro (PSDB), Leonardo Visera (PP) e o próprio Ícaro. Para ir contra o parecer do TCE e reprovar as contas de Juarez, era preciso um placar oposto, com 11 votos pela reprovação.

 

Documento perdido

Ícaro tratou de rastrear o processo referente as contas do ex-prefeito. Ele descobriu que o parecer foi expedido pelo TCE no dia 21 de dezembro de 2017. O próprio tribunal levou um ano para analisar as contas, fechar seu julgamento e ser enviado para Câmara de Sinop. Segundo Ícaro, o documento foi recebido por um servidor da Câmara em janeiro de 2018.

Após a votação, Bortoli explicou o motivo da demora na apreciação das contas. O presidente disse que o documento, recebido pelo servidor, nunca chegou a departamento correto, que deveria fazer a distribuição do processo para as comissões competentes. Ou seja, as contas do ex-prefeito “sumiram”. “Depois que o TCE nos cobrou para que a Câmara votasse as contas de 2016 é que foi dada a falta do processo”, contou o presidente.

A Câmara teve que resgatar uma segunda via, junto ao TCE, para colocar à apreciação. Segundo Bortoli, o processo foi encaminhado para as comissões competentes durante o período eleitoral, o que para o presidente derruba a tese de “conchavo” político para proteger a candidatura de Juarez. “O processo foi encaminhado para as comissões assim que foi localizado. O projeto ficou 40 dias para análise das comissões. Então não vi razão para adiarmos ainda mais a votação das contas”, declarou Bortoli, ao responder a indagação de que sua postura – de não colocar o requerimento do vereador Ícaro em votação – foi arbitrária. “De qualquer forma instalaremos um processo administrativo para apurar o fato envolvendo o servidor que recebeu o processo”, completou.

O GC Notícias tratou de ir atrás desse servidor. Ele é Luiz Carlos Martins Moraes Junior. Ele é funcionário concursado da Câmara desde dezembro de 2012 para o cargo de auxiliar legislativo. Ao GC Notícias, Luiz disse que recebeu o processo do TCE em janeiro de 2018, período em que a Câmara fica de recesso legislativo. “Eu e um outro funcionário nos revezávamos para pegar a correspondência nos Correios. Nesse dia do relatório acabou sendo eu. O que eu fiz foi pegar toda a correspondência nos Correios, levar para Câmara e destinar cada uma para o devido departamento”, contou Luiz.

Segundo o servidor, o relatório estava em um envelope lacrado, assim como toda correspondência e só se lembra do fato pelo “volume” do pacote. “Até ontem eu não sabia que aquele pacote se referia as contas do ex-prefeito. Eu só sabia que era um envelope grande e volumoso que veio do TCE para Câmara. Recebi nos Correios e levei para Câmara”, contou.

Luiz declarou que não se lembra com quem deixou o pacote. “Isso foi no início do ano. Fiz isso várias vezes. Não me lembro com quem deixei”, conta. Segundo ele, não havia sido implantado um sistema de protocolo até então, que registrasse o destinatário final de cada correspondência. “Infelizmente, o último registro desse documento acaba sendo minha assinatura na AR nos correios. Mas eu só peguei o pacote e entreguei”, afirma.

Como Luiz não sabe para quem entregou e não há qualquer sistema de protocolo que valide o que comprove sua versão, o servidor acabará respondendo pelo sumiço do documento oficial. Um procedimento administrativo será aberto para apurar o fato.

 

O que tinha para esconder?

Embora a situação passe a impressão de um conchavo político para que Juarez não tivesse qualquer problema para registrar sua candidatura de deputado federal, na prática, o relatório expedido pelo TCE é bastante favorável ao ex-prefeito.

O Tribunal de Contas aprovou o balanço financeiro da gestão, atribuindo conceito “A” para as contas de Juarez – o mais alto. O relatório deu uma nota, através do Índice de Gestão Fiscal, de 0,80 – em uma escala que vai até 1. Essa foi a 5ª melhor avaliação do Estado. Na média geral, os municípios de Mato Grosso tiveram notas de 0,56.

Na Educação, Juarez cumpriu 10 dos 10 indicadores avaliados. Na saúde, foram 7 de 10, ficando acima da média estadual, de 5 pontos. No quesito responsabilidade fiscal, o ex-gestor atendeu aos pré-requisitos. Sua despesa com folha de pagamento foi de 46,5% do orçamento (o limite é 54%). Na Educação, Juarez investiu 34,39% do orçamento anual, ultrapassando o mínimo exigido de 25%. O mesmo ocorreu com saúde. A lei determina que pelo menos 15% do orçamento seja aplicado nessa finalidade. Juarez aplicou 33,69%. A arrecadação também foi superavitária. A previsão era de que o município arrecadasse R$ 331 milhões no exercício 2016. Acabou arrecadando R$ 368 milhões – 11% a mais.

Ícaro, que tentou suspender a apreciação das contas, frisou que o TCE apontou duas irregularidades nas contas do ex-gestor, sendo uma grave e outra gravíssima. De fato, o tribunal manteve duas irregularidades mesmo aprovando as contas do ex-prefeito.

A irregularidade de natureza “grave” é referente a gastos nos últimos 2 quadrimestres do ano acima da dotação orçamentária. Isso ocorreu nas fontes 117 e 190 – que são as contas do Transporte Escolar e Tesouro Municipal, respectivamente. Juarez acabou gastando R$ 2,2 milhões a mais do que estava previsto nessas duas dotações para o período. No entanto, conforme pontuou o próprio TCE, essas despesas foram empenhadas e não consolidadas. Ou seja, a prefeitura sinalizou o gasto, mas não efetuou o pagamento. O tribunal reconheceu ainda que a despesa foi contraída em abril de 2016, portanto, no primeiro quadrimestre, afastando assim a irregularidade.

A segunda irregularidade, de natureza gravíssima, também é um “tropeção contábil”. Durante o mandato, Juarez acabou apresentando créditos adicionais suplementares acima dos valores que possuía para cobrir. Créditos suplementares é o dispositivo utilizado pelo município para aumentar o orçamento de determinada conta. O orçamento municipal é estipulado sempre no ano anterior, geralmente entre agosto e setembro. Nele está a previsão de quanto a prefeitura vai gastar em cada finalidade, baseado na expectativa de arrecadação.

O que ocorre é que, apesar de ser o último ano do mandato, 2016 foi bastante ativo, com muitas obras e investimentos em andamento. Para tentar “encaixar” o superávit de arrecadação, Juarez fez um crédito adicional de R$ 33 milhões. Segundo o TCE, os valores nas fontes eram insuficientes para cobrir esse crédito. A gestão, então, manobrou para aproveitar o superávit do exercício anterior, na ordem de R$ 29,7 milhões. Mas restaram R$ 2,7 milhões sem lastro. O orçamento acabou ficando maior do que a arrecadação – o que não pode ocorrer na gestão pública. A defesa do ex-prefeito tentou explicar para o TCE que existia recurso para cobrir essa diferença, oriundo do excesso de arrecadação, projetado com base no registrado ao longo do ano anterior, 2015.

Não colou. O TCE manteve a irregularidade, mas ponderou o motivo pelo qual não reprovou as contas de Juarez. De acordo com o relator do processo, essa diferença de R$ 2,7 milhões corresponde a 0,84% do orçamento geral anual. Ou seja, na prática, não teve impacto nas contas públicas, uma vez que o saldo acabou sendo coberto pela arrecadação no final da gestão.

Com essas ponderações, o TCE aprovou as contas de Juarez. O “normal”, ao longo da história de Sinop, é a Câmara votar acompanhando o parecer. Por isso, não havia uma razão obscura aparente para o servidor sumir com o documento.