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Sinop

Juiz obriga Bradesco a indenizar família que comprou casa em leilão viciado

Venda de imóvel foi anulada anos depois porque banco não seguiu as regras do próprio leilão

Geral | 15 de Outubro de 2025 as 14h 39min
Fonte: Jamerson Miléski

Foto: Arquivo

Imagine você comprar uma casa para ser o lar da sua família, se estabelecer nela, fazer melhorias, ver seu filho nascer embaixo daquele teto e, 9 anos depois, receber um aviso que o imóvel não lhe pertence mais. Essa foi a situação vivida por Marco Antônio Barbosa Marçal e sua família, que precisaram apelar à Justiça para conseguir arrancar do banco uma indenização pelo imóvel que adquiriram e edificaram.

O imóvel, uma casa na Rua das Morangueiras no Jardim Violetas, foi comprado no ano de 2014, em um leilão extrajudicial realizado pelo Banco Bradesco. O até então proprietário tinha dívidas com o Banco, que tratou de leiloar o imóvel como forma de executar a cobrança.

Marco Antônio participou do leilão e ficou feliz quando seu lance de R$ 99 mil arrematou a casa. Tempos depois se mudou para ela com sua esposa Ivanilde. O casal fez melhorias na casa, instalou mármores, armários e aparelhos de ar condicionado. Deram sorte inclusive de ter o asfalto chegando na rua da sua residência no mesmo ano.

Então, 9 anos depois, em 2023, uma decisão judicial anulou o leilão realizado pelo Bradesco. O banco não cumpriu com uma das mais conhecidas normas constitucionais, que é a notificação do devedor para que o mesmo tenha a oportunidade de arrematar o seu imóvel. Ou seja: o antigo proprietário tinha prioridade de comprar a casa e pagar o Bradesco. Mas o banco não fez esse procedimento.

Isso causou um “vício procedimental” de responsabilidade exclusiva do Bradesco. Foi assim que categorizou o juiz da 1ª vara cível do Fórum de Sinop, Cleber Zeferino de Paula. O magistrado foi responsável por julgar a ação movida pela família contra o banco na tentativa não de reaver sua casa, mas de pelo menos obter uma indenização condizente.

Em sua decisão, expedida em abril desse ano, Zeferino de Paula, explica que o caso se trata de uma “evicção” – termo jurídico que se refere a perda de um bem devido a uma decisão judicial ou administrativa. Em resumo, o Bradesco vendeu algo que não lhe pertencia e por isso essa venda era nula. O magistrado lembra que a lei prevê a possibilidade de firmar negócios que atenuam as responsabilidades do vendedor em caso de evicção – o que o Bradesco fez em seu contrato. No entanto, para Zeferino de Paula, nesse caso o contrato ofertado pelo Banco foi unilateral e não havia condições do comprador, Marco Antônio, negociar qualquer um dos termos. “Forçoso reconhecer que no momento da celebração do contrato de venda e compra, o requerido não pautou a sua conduta pela necessária boa-fé, uma vez que omitiu informação essencial para efetivação do negócio, mesmo sabendo que poderia perdê-lo, dada a ausência dos procedimentos indispensáveis antes de submeter o imóvel a leilão, ensejando, posteriormente, em sua anulação, impedindo a posse da parte requerente [do comprador]”, relatou o juiz em sua sentença.

Casa que foi para leilão

Na sua decisão, Zeferino de Paula, deixou claro que não bastava ao Bradesco devolver os R$ 99 mil que Marco deu no leilão. Nove anos depois, ainda mais em Sinop, o valor daquele bem já era outro. O magistrado se guiou por um laudo de avaliação acostado no processo, que dizia que a casa valia R$ 574.882 em agosto de 2023 – quando a evicção foi enfim consagrada, com o trânsito em julgado da ação que cancelou o leilão. A esse valor o juiz adicionou juros de mora, correção monetária (INPC) e também outras despesas que a família teve, como mudança, desinstalação e instalação de mármore, montagens e desmontagens de armários e guarda-roupa, desinstalação e instalação de aparelhos de ar condicionado e 7 meses de aluguel de uma nova casa. As despesas com o advogado também entraram nessa conta.

No total, Zeferino de Paula determinou que o Bradesco indenizasse a família em R$ 777.180,57, sendo: arrematação do imóvel (R$ 99.000,00), comissão de leiloeiro (R$ 4.950,00), taxa de transferência da propriedade (R$ 158,00), escritura pública de compra e venda (R$ 2.341,48), registro do Imóvel (R$ 2.283,24), custas processuais para ajuizar a ação de imissão na posse (R$ 990,00), valorização do Imóvel (R$ 463.000,00), locação de nova residência (R$ 19.000,00), montagens e desmontagens de armários e guarda-roupa (R$ 800,00), desinstalação e instalação de aparelhos de ar condicionado da residência (R$ 2.070,00), desinstalação e instalação de mármore da residência (R$ 1.520,00) e os honorários advocatícios.

A decisão do juiz de primeira instância foi referendada pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso. No recurso julgado pelo desembargador Márcio Aparecido Guedes, em setembro de 2025, os danos materiais devidos pelo Bradesco foram referendados. Além disso, na segunda instância, foi adicionado um dano moral. Zeferino de Paula havia descartado o dano moral na sua sentença, adotando uma linha de entendimento mais consolidada, de que negócios podem ser frustrados e que quem participa deles está ciente – não causando assim prejuízo psicológico ou moral, apenas “mero aborrecimento”, ainda que nesse caso fosse um grande aborrecimento.

Guedes já pesou a mão nessa questão. “A perda abrupta da moradia familiar, com a necessidade de desocupação forçada e busca de nova residência, configura situação excepcional que ultrapassa os dissabores ordinários da vida em sociedade, atingindo direitos fundamentais como a moradia e a dignidade da pessoa humana, consagrados na Constituição Federal”, relatou o juiz em seu voto.

Com esse entendimento foi aplicado uma indenização de R$ 10 mil para fins de Dano Moral. Na conta, atualizada no dia 6 de outubro, o Bradesco terá que indenizar Marco Antônio em R$ 881.734,36 por ter vendido uma casa e não entregado. Desse valor o banco já pagou R$ 234.421,12, restando um saldo de R$ 650.029,40. O Bradesco também precisa quitar o advogado: R$ 382.250,54.

Na semana passada, Marco Antônio e seu advogado entraram com uma petição para cumprimento de sentença, na primeira vara de Sinop, pedindo a justiça que o banco pague os R$ 1.032.279,94 que deve.

Na tarde desta quarta-feira (15), Zeferino de Paula julgou a petição. O magistrado determinou que o Bradesco fosse intimado e estabeleceu um prazo de 15 dias para o banco pagar a conta. Caso não quite a dívida referente a indenização, a ordem judicial é para que em 5 dias sejam recalculados os valores, acrescidos de 10% de multa e que sejam indicados os bens que o Bradesco tem para a penhora. A decisão prevê que esses bens fiquem com Marco Antônio, na condição de fiel depositário, até que seja suficiente para cobrir o valor a ser indenizado.